SOBREVIVENDO COM STORYTELLING

AVISO - ESSE POST É UMA HISTÓRIA 100% REAL


















Já faz muito tempo que quero escrever esse post. Ele demorou mais de três meses para ficar pronto. Três meses que eu passei na estrada, sem dinheiro, vivendo apenas contando histórias.

Eu não sei onde tudo começou. Se foi após o término desastroso de algum relacionamento amoroso, ou talvez a gota d'água de uma vida de trabalho que jamais me satisfez, ou até mesmo quando a Dilma e o Geraldão ganharam as eleições. Quando as pessoas me perguntam de onde veio a ideia de jogar tudo para o ar, prefiro responder que me inspirei em uma história que começou antes da minha, quando meu avô foi embora da miséria do pós-guerra na Itália e foi buscar a sorte no Brasil.

Seguindo o caminho inverso daquele homem que tenho como herói pessoal, comprei um bilhete de ida só para a Itália, mas sem a intenção de me acomodar lá por muito tempo...

Contei pouca coisa para pouca gente. Da Itália eu planejava começar uma etapa da minha vida chamada: "Stefano Giorgi e a Última Cruzada". Eu iria de Roma a Jerusalém sem dinheiro, em busca de mim mesmo e de Deus. E quando digo Deus, apesar de ser católico, me refiro a todas as crenças, inclusive aquelas crenças que acreditam em nada. #queironia

O começo foi a pior parte. Eu iria fazer couchsurfing pela primeira vez na minha vida. Não tinha a menor ideia do que esperar. E também tinha duas missões na Itália: ir para uma audiência com o Papa e encontrar a família do meu avô na Toscana. Naquele ponto eu tinha uma página em branco na minha frente, apenas com ideias de como começar minha história. E páginas em branco dão medo. Mas a vida é muito melhor com um frio na barriga, então eu liguei o foda-se e fui realizar meu sonho com medo mesmo.

Em Roma eu tentei fazer todo o tipo de serviços em troca de moedas para sobreviver. Infelizmente, ninguém queria nada que eu pudesse oferecer. Mas as pessoas me davam ajuda com comida e com passagens de metrô. No meu aniversário, uma mulher me deu um saco de pão. Por mais faminto que eu estivesse, era pão demais para mim, então eu resolvi dividir com os mendigos da cidade. Foram eles que me ensinaram tudo o que eu precisava saber sobre a vida de cigano nas estradas, mas isso é material para um outro post.

De Roma eu fui para a Toscana. Uma menina com quem eu saí na noite anterior me deu um bilhete de trem. É impressionante como ser um aventureiro é envolvente para o sexo oposto.

Passei uma semana conhecendo meu avô que morreu quando eu tinha apenas cinco anos de idade. Depois de me despedir da minha família, achei uma comunidade anarquista em uma biblioteca debaixo de um castelo medieval, onde vivi por cinco dias sem água quente ou energia elétrica. Achei meio que na sorte, em uma tentativa desesperada de não morrer congelado nas montanhas.


Voltei para o couchsurfing e fui para Nápoles em busca de um navio para cruzar o Adriático. Descobri que estava do lado errado da península. Pulei dois trens, e fui preso. Fui solto e pulei mais um trem. Cruzei o mar praticamente em uma barca de refugiados para a Albânia, onde conheci uma holandesa evangélica que me levou para sua igreja e me deu teto e comida por uma noite. Naquele ponto eu finalmente tinha algumas histórias para contar, e comecei a contá-las.

Desci a Albânia toda por carona. A maioria das pessoas ali nunca tinha visto um brasileiro na vida, então faziam de tudo para me ajudar. Posso dizer que conheci Baba Tomori e os antigos deuses albaneses, mas o melhor de tudo foram as pessoas que passaram pelo meu caminho. Uma noite dois policiais fizeram um bloqueio na estrada para pararem todos os caminhões que passavam e acharem um para me levar ao meu próximo destino.


Da Albânia eu fui para a Grécia. Meu primeiro destino foi Meteora, a enorme formação rochosa repleta de monastérios ortodoxos. Lá uma freira me deu um amuleto de Santo Stefano depois de ouvir que eu estava a caminho de Jerusalém. Depois daquilo, sempre que estava fodido no meio do nada, comecei a fazer uma prece para Santo Stefano, e posso dizer que até agora ele nunca me deixou na mão. De Meteora fui para Atenas, onde conheci uma semi-deusa grega. De Atenas fui prestar minha homenagem aos 300 de Esparta e aproveitei para tomar banho na fonte que Hefesto fez para curar Hércules.



Segui para Salônica e depois para Istambul, onde dois amigos turcos que eu conheci na comunidade anarquista me hospedaram.


Pisei na Ásia pela primeira vez na vida. Fui em busca da armadura de São Jorge na Capadócia, mas só achei chaminés de fadas que mais pareciam pirocas gigantes. Mas talvez tenha sido São Jorge que me salvou da morte certa, quando eu caí de um penhasco ao invadir um museu a céu aberto (o pior de tudo é que eu invadi o museu errado).


Continuei rumo ao sul. Peguei a carona com um sírio que me deu um lugar para dormir e comida a noite. Ele tinha sete outros amigos, nenhum com passaporte e muito menos vistos para estarem na Turquia. Não demorou muito para eles me dizerem que estavam contrabandeando moedas de ouro. Demorou menos ainda para eles pedirem ajuda e me oferecerem uma parte do tesouro como pagamento. E demorou só um pouco mais para eu descobrir que eles queriam me matar.

Fugi para Chipre. Lutei Jiu Jitsu contra sete caras para poder dar aulas. Não perdi nenhuma luta. Consegui dinheiro. Continuei pegando carona e contando minha história para entreter os motoristas. Ganhei 200 euros em um dia.

Comprei uma passagem para o Líbano. Fiquei em uma cidade a duas horas de distância do ISIS, onde curti uma das melhores baladas da minha vida. Depois de uma semana descansando na casa de amigos, fui para a Jordânia e logo em seguida para Israel. Era domingo de Páscoa quando eu entrei em Jerusalém. Não conseguia parar de chorar, pensando que tinha finalmente chegado.

Eu não achei Deus em Jerusalém. Achei ele na estrada, com as pessoas que eu conheci. Mas depois de tudo o que eu passei, senti que Deus me deu uma vida nova. Mais uma página em branco. Agora eu não partia mais em busca de Dele ou de mim mesmo, e sim de uma casa.

Muitos viajantes que conheci ao redor do mundo e ficaram meus amigos no Facebook começaram a me mandar mensagens me convidando para visitá-los. Comecei a traçar meu novo caminho.

Encontrei uma passagem barata para a Hungria que eu poderia comprar com o resto do dinheiro que tinha sobrado. Fui para Budapeste, onde conheci uma princesa num castelo com quem falo até hoje. De lá fui tomar um porre em Bratslava, em um festival de cerveja. Ao devolver copos ganhava 2 euros... resultado: enchi a cara e lucrei!


De Bratslava fui para Praga. É quase impossível pegar carona na República Tcheca e não ficar chapado. Até hoje não sei como cheguei em Praga.De Praga fui para Berlim e de Berlim para Sonderborg na Dinamarca. Lá ganhei um corte de cabelo. Realmente, eu precisava. Depois de quase três meses eu parecia um mendigo... o que não era muito distante do que eu era.


Desci para Hamburgo onde dormi (na verdade não) na casa de uma gata alemã que conheci em uma balada. De Hamburgo fui para Colônia visitar uma amiga de infância. Meu caminho ideal era descer direto para a Suíça e de lá ir para a Itália. Mudei de ideia de última hora e fui para a casa de uma amiga em Maastrich na Holanda. Acho desnecessário dizer como eu passei meu dia na Holanda, mas deixo para você imaginar.

Uma amiga da minha mãe me convidou para visitar Luxemburgo. E graças a Deus eu fui. Não poderia ter sido melhor recebido, e ganhei uma passagem para Ibiza. Mas teria que sair de Pisa na Itália que estava a mais de 1000km de distância.

Corri como um louco e consegui chegar onde eu queria na hora que eu queria. Dormir na rua na Suíça é crime, e eu não poderia ser preso, senão perderia minha passagem. Então fui para uma igreja, e contei minha história. Um cozinheiro italiano me deixou dormir na casa dele e me ofereceu um excelente jantar. Dia seguinte, continuei minha corrida desesperada.

Eu cheguei a tempo e peguei o avião. E encontrei uma casa... a parte difícil será mantê-la. Mas isso é uma história para outro dia e outro post.

Eu não toco nenhum instrumento, sou péssimo em desenhar e não sei dançar sóbrio. Meu único talento é contar histórias. Quando contava minhas histórias, fossem histórias do Brasil, histórias de relacionamentos amorosos ou histórias que eu estava vivendo naquela aventura, tentava envolver ao máximo meus ouvintes, para que eles se sentissem uma parte da história também. E exatamente por isso tanta gente me ajudou. Com comida, com carona, com teto, ou simplesmente com uma boa conversa. É esse envolvimento com o ouvinte que o bom Storyteller deve buscar sempre. E que me ajudou a sobreviver durante três meses. E essa história que acabei de contar para você que está lendo esse post também não é só minha, é de todos aqueles que me ajudaram no meu caminho.

Caso você ficou interessado e queira saber mais sobre a minha história, me procure no Instagram @ststfeano

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