O QUE PODERIA SER Storytelling MAS AINDA É storytelling - 5 casos em que perguntas foram deixadas sem respostas

Da Série Desvendando o Storytelling: # Post 4
Para ver o # Post 5 O QUE É STORYTELLING
Para ver o # Post 3: O QUE TODO MUNDO DIZ SER STORYTELLING
Para ver o # Post 2: O QUE TENTA ENGANAR NO STORYTELLING
Para ver o # Post 1: O QUE NÃO É STORYTELLING
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A Decisão


Amélia estava rindo a aproximadamente cinco minutos, desde que Carlos havia lhe mostrado o presente. Mas o riso que levava lágrimas a brotar de seus olhos não era de alegria. Era indignação, raiva, nervosismo. Ela sempre tivera problemas em lidar com suas emoções. Parecia que seu corpo não entendia qual era a coisa certa a se fazer em cada ocasião. Em todos os cinco anos de casados, Carlos sempre havia lhe dado presentes caros. Agora, ela suspeitava que eram o modo encontrado por ele para se redimir de tudo o que fazia de errado sem que ela soubesse. Há seis anos atrás, eles eram dois jovens apaixonados. Carlos a havia incentivado a fazer coisas que ela nem sabia que seria capaz. Ele a ajudou a largar a faculdade, desafiando seus pais e os obstáculos foram enormes. Acabaria ficando sem dinheiro e sem lugar para morar naquela época, se não fosse por ele, sempre pronto para ajudá-la. Agora, ela se lembrava daquela garota assustada de anos atrás, mas ela lhe parecia distante, quase como um personagem em um livro.  Quanto ao garoto apaixonado, ainda era visível no rosto do homem que lhe encarava com olhos de súplica. A decisão parecia simples, perdoá-lo e salvar seu casamento, ou mandá-lo embora, recuperando seu orgulho próprio. Mas nada que machuca o coração é simples. Seria muito difícil esquecer a dor que estava sentindo e aceitá-lo, sabendo que poderia novamente traí-la, quebrando seu coração novamente em pedaços.  
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Muito bem. Agora temos uma história melhor estruturada. Temos um personagem principal, Amélia, que passa por dificuldades, obstáculos e consegue o que quer, até chegar em outro problema: uma traição. O conflito força Amélia a fazer uma escolha. Mas isso é Storytelling? Ainda não. Começamos a ter um resquício de Storytelling, mas ainda estamos longe disso. Seria o que chamamos de storytelling, com "s" minúsculo. Esse é feito de qualquer jeito, colocando apenas elementos da narrativa de uma forma equivocada. Por exemplo: No texto "A Decisão" apresentamos trechos de uma jornada, mas ainda estão expressos de modo confuso e destoante.

Mas o que falta?

Se fossemos estruturar isso como Storytelling, teríamos que separar o que foi colocado em dois momentos.

O primeiro seria sobre a jornada de Amélia de auto descobrimento, quando ela teve que abandonar o que a família acreditava ser bom e passar a escolher por si própria. O incidente que levou Amélia a uma mudança poderia ser Carlos, que impulsiona Amélia a sair de sua "zona de conforto". Teríamos que mostrar a transformação clara de "Amélia sem auto-confiança, sendo manipulada pelas opiniões de outros" e ao final "Amélia confiante, segura de si, fazendo escolhas por conta própria". Ao meio da jornada teríamos que fazer Amélia merecedora da auto-confiança para que sua transformação fosse crível. Para isso, ela teria que passar por grandes obstáculos e complicações ainda piores.

O segundo momento da história seria sobre o casamento de Amélia e Carlos.  Teríamos que definir o que fez Amélia chegar no momento em que deve fazer a escolha de perdoá-lo ou não. No que implica essa escolha? O que acontece com Amélia se ela o perdoa? E o que acontece se não perdoa. O que ela tem a perder precisamente? E por que o que ela perde é importante para ela. Qual a transformação que essa escolha gera?

São diversas perguntas a serem respondidas. Então vamos a 5 casos que não responderam perguntas como essas:

1)  O filme "Eu, Frankenstein" - Conflitos e escolhas fracas
Sabemos que re-leituras de histórias já contadas estão na moda e, com certeza, essas novas interpretações vendem. Mas não adianta ter um personagem conhecido e deixar o público  decepcionado. Esse é o caso do filme "Eu, Frankenstein". O filme fala sobre o conflito de Frankenstein, o único ser que não possui alma no mundo todo. A transformação é clara: No começo do filme, Frankenstein não tem alma; ao final, ele ganha uma alma. Mas ainda assim, a narrativa é fraca. Os personagens não parecem ter vida fora do momento em que estão na tela. A estrutura é seguida, mas as decisões feitas tornam-se sem sentido já que as alternativas carecem elaboração. Por exemplo, a mocinha, em determinado momento deve decidir entre ressuscitar seu colega de trabalho, que renascerá sem alma e será habitado por um demônio (isso também levará à destruição o mundo), ou simplesmente deixar seu colega morto sem que o mundo seja destruído e que ele seja habitado por um demônio. Estranhamente ela escolhe a primeira opção, desvalorizando o poder de discernimento da audiência. No caso, as proporções e as cargas das escolhas foram feitas de maneira equivocada.

Perguntas não respondidas: O que tem-se a perder com as escolhas e o que isso representa para esses personagens?


2) Comédias românticas que se perdem no clichê
Storytelling não é só estruturar de modo que o filme cumpra o "check list" de tudo o que tem que acontecer, é também inovar e dar voz artística ao como tudo vai acontecer. Sabemos que toda comédia romântica deve, sem exceção ter uma cena de "garoto encontra garota". É um fato que tal cena deve existir. Mas se o autor coloca em seu roteiro "Garota derruba papéis e garoto corre para ajudá-la", ele estará reproduzindo o que milhares de filmes já fizeram. Não basta a cena ter funcionado em outros filmes, ela precisa funcionar para essa história. Se depois de percorrer diversas alternativas sobre como a cena "garoto encontra garota" deve ser, o autor chegar a conclusão de que derrubar os papéis é o que se encaixa melhor no contexto dos personagens, daí sim, essa será uma cena que fará sentido para a audiência.

Perguntas não respondidas: Qual a relevância da escolha dessas cenas para os personagens?


3) Filmes Biografia e só
Vamos comparar dois filmes sobre o mesmo tema, só que construídos de maneira diferente. O filme "Chico Xavier" e o filme "Bezerra de Menezes - diário de um espírito". Os dois narram a trajetória de figuras do espiritismo. Independentemente do teor dos filmes, em questão de narrativa, um acerta e o outro erra. No filme sobre Chico Xavier, o autor de forma muito inteligente intercala a narrativa da vida de Chico com a história de uma família que ele influenciou. Mas por que isso foi tão inteligente? A vida inteira de uma pessoa é um âmbito muito grande para uma jornada. Devemos trabalhar sempre, no Storytelling, com recortes significativos. Além disso, tem-se a transformação necessária do personagem. Chico começa como uma criança boa e gentil e termina como um homem bom e gentil. Ele tem algumas questões e conflitos também trabalhados sobre a vida difícil que levou, porém, com um recorte tão extenso, esses conflitos não tem a chance de serem aprofundados. Já a família começa com um problema bem claro: são incapazes de perdoar o suposto assassino de seu filho. Ao final do filme, acabam salvando o menino da prisão.
Agora analisando a segunda biografia de Bezerra de Menezes. Temos no filme apenas uma narração de fatos. "E então isso aconteceu. Depois isso, e assim por diante". Uma biografia formada por narração de eventos, apesar de poder ser transformada em filme, não é Storytelling.

Perguntas não respondidas: Qual a transformação feita? O que exatamente foi superado?


4) Games com dissonância
Em alguns jogos que são permeados por uma narrativa, muitas vezes há uma dissonância entre o personagem da história contada na interação do Game e o personagem quando se transforma em jogador. Por exemplo, quando a história conta que o personagem em questão é um super herói que passou por diversos testes e superou desafios, espera-se que o jogo apresente tarefas a altura do personagem apresentado. Mas quando esse super herói cheio de poderes tem dificuldade até para abrir uma porta sozinho, acontece uma falha de narrativa. Não adianta fazer o Storytelling para animação do jogo, quando não é isso que o jogador está vivendo. Um dos jogos em que acontece isso é o Mortal Kombat vs DC Universe.


5) Percy Jackson - Adaptações mal sucedidas
Transformar um best seller em filme, nem sempre é certeza de sucesso. É preciso entender as diferenças entre um livro escrito e o filme de longa metragem que será apresentado na tela. Ao mesmo tempo deve-se ter em mente que alterar o formato não significa mudar a essência da história. Ocultar informações importantes pode fazer com que a narrativa tão aclamada pelos leitores, torne-se motivo de revolta. Nos filmes de Percy Jackson, os roteiristas e produtores ignoraram erros graves em relação à narrativa, que rendeu o cancelamento da filmagem do terceiro filme da série. No primeiro filme, um personagem importante que batia de frente com Percy(personagem principal) foi retirado, tirando também da trama um dos conflitos de Percy. Além disso o filme foi tratado de forma superficial, seguindo uma estrutura, mas sem capturar a essência do livro. No segundo filme, a história também ficou incompleta, já que muitas informações utilizadas na história eram continuações do que  deveria ter sido apresentado no primeiro filme. Para consertar, outras alterações foram feitas, bagunçando ainda mais os dados da história e revelando peças chaves em momentos não propícios para a trama.

Perguntas não respondidas: Como as circunstâncias apresentadas afetam na vida dos personagens? Como são relevantes? Como os eventos da série se interligam? Como estabelecem relação de causa e efeito?

Mais uma vez fica clara a minuciosidade necessária ao se pensar em Storytelling. Mesmo seguindo estruturas e receitas que já deram certo, podemos errar se não nos atentarmos para os mínimos detalhes e não trabalharmos bem com o universo que desejamos criar.

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