MOSTRANDO HISTĂRIAS COM DOUGLAS ADAMS
Logo nas primeiras pĂĄginas do “Mochileiro das GalĂĄxias” Ă©
possĂvel perceber uma aula de storytelling digna de adoração. Mas nĂŁo adianta
eu ficar falando e falando sem mostrar nada, entĂŁo, aqui vai uma das primeiras
cenas do livro “O Mochileiro das GalĂĄxias” de Douglas Adams.
“Ăs oito horas da
manhĂŁ de quinta-feira, Arthur nĂŁo estava se sentindo muito bem. Acordou com os
olhos turvos, levantou-se, andou pelo quarto
sem enxergar direito, abriu uma janela,
viu um trator, encontrou os chinelos e foi até o
banheiro.
Pasta na escova de
dentes – assim.
Escovar. Espelho mĂłvel
– virado para o teto.
Arthur
ajustou-o. Por um momento, o espelho
refletiu um segundo trator pela janela
do banheiro.
Arthur reajustou-o,
e o espelho passou a refletir o rosto barbado de Arthur Dent. Ele fez a barba,
lavou o rosto, enxugou-o e foi até a cozinha em busca de alguma coisa agradåvel
para pĂŽr na boca.
Chaleira, tomada,
geladeira, leite, café. Bocejo.
A palavra trator
vagou por sua mente, procurando algo com o que se associar.
O trator que estava
do outro lado da janela da cozinha era dos grandes.
Arthur olhou para
ele.
"Amarelo",
pensou, e voltou ao quarto para se vestir. Ao passar pelo banheiro, parou para
tomar um copo d'ågua, e depois outro. Começou fa desconfiar que estava de
ressaca. Por que a ressaca? Teria bebido na véspera? Imaginava que sim. Olhou
de relance para o espelho mĂłvel. "Amarelo", pensou, e foi para o
quarto.”
Grande parte do processo de aprendizado e do trabalho de um
storyteller estĂĄ em ler e assistir coisas e o Douglas Adams sempre foi
referĂȘncia para todos os storytellers, cineastas e leitores fanĂĄticos que eu
conheço, mas até ganhar uma edição especial com seus 5 livros eu não tinha lido
nada e conhecia muito pouco sobre sua obra.
Ao ler o trecho acima eu nĂŁo pude evitar pensar na frase de
Mark Twain que diz “NĂŁo diga que a senhora gritou. Chame-a e deixe-a gritar”.
Essa ideia de “Mostrar e nĂŁo contar” a que somos submetidos quando começamos a
estudar e entender o que torna uma narrativa agradĂĄvel e atraente Ă© uma difĂcil
lição para mim. Ao invĂ©s de dizer que Arthur Dent Ă© intelectualmente “lento”, Adams,
faz com que o atento perceba os fatos sem que ele precise explicĂĄ-los. Adams Ă©
um mestre nisso e por todo o primeiro livro de sua obra podemos perceber que
tudo Ă© assim, pouco explicado, mas fĂĄcil de entender. Pensei em vĂĄrias maneiras
de escrever esse post, queria criar um texto novo para demonstrar isso tudo,
mas Ă s vezes sĂł os mestres conseguem mostrar o que devemos aprender.
Primeira regra do storytelling que eu aprendi: “Show, don’t
tell”.
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