50 TONS DE CINZA, UMA TRADUÇÃO PRECIPITADA





NĂŁo estou aqui para falar de red herring ou de deep point of view, deixo essa missĂŁo para o Fernando Palacios no hangout do nosso grupo no dia 22 Ă s 20.00 horas na webcam mais prĂłxima de vocĂȘ. Hoje eu quero falar de tradução e da sua importĂąncia na literatura e no storytelling. 

O tĂ­tulo original "50 shades of Grey" Ă© um tĂ­tulo carregado de significados na lĂ­ngua inglesa e muito bem trabalhado do ponto de vista publicitĂĄrio. Uma Ăłtima e complexa brincadeira linguĂ­stica capaz de chamar a atenção do mais desatento leitor. Mas infelizmente o que me parece Ă© que o tĂ­tulo foi traduzido sem que ninguĂ©m tivesse lido o livro para fazĂȘ-lo. 

Visto que a palavra "shade", alĂ©m de sua tradução literal como "tons" tambĂ©m expressa de maneira ampla as nuances e facetas (ou personalidades) de uma pessoa ou situação, gerando atĂ© o termo "shady" usado como adjetivo para se referir a pessoas misteriosas e diferentes, obscuras e de certa maneira causadoras de desconforto naqueles ao seu redor. 

A palavra Grey usada como sobrenome do personagem principal, tambĂ©m pode ser traduzida como cinza, ou seja, a cor que fica entre o branco e o preto, entre o bem e o mal. JĂĄ vimos em Senhor dos AnĂ©is a transformação de Gandalf em sua forma imperfeita conhecida como "Gandalf the Grey" ou "Gandalf o Cinzento" para o mago branco, a representação do bem e da justiça. 

Em certo momento na narrativa de 50 tons de cinza o protagonista Christian Grey se apresenta ao usar a frase "I am the 50 shades of Grey" fazendo uma clara referĂȘncia as suas caracterĂ­sticas pessoais, ou seja, sua personalidade, ou personalidades, que se tornam ao longo da histĂłria um dos pontos principais do livro. Essa frase, que pode ser traduzida como "eu sou as 50 faces de Grey", Ă© de extrema importĂąncia para que o leitor se relacione com o personagem e entenda um drama pessoal desse protagonista, alĂ©m de explicar nesse momento o tĂ­tulo do livro e dar ao leitor a sensação de que ele estava desde a capa envolvido com uma grande e complexa trama de cunho psicolĂłgico. PorĂ©m esse efeito se perdeu quando o tĂ­tulo do livro foi traduzido para "50 tons de cinza" acabando com a relação entre o tĂ­tulo e o protogonista e tornando toda a narrativa mais superficial e, na minha opiniĂŁo, deixando tudo um tanto menos interessante. 

O red herring ainda estĂĄ no livro, assim como as tĂ©cnicas usadas no telling. Uma tradução dificilmente altera a ordem em que as coisas foram apresentadas ou o processo criativo. Os personagens sĂŁo os mesmos, assim como o processo criativo do autor se manteve. No fundo, no fundo, estamos falando da mesma histĂłria, mas de um texto completamente diferente. AtĂ© que ponto a tradução pode ajudar ou arruinar uma boa histĂłria? 



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