Storytelling - um tiro certeiro na Guerra Intermidiática


Em 1971, o economista americano e ganhador do Prêmio Nobel da Economia Herbert Simon observou que a quantidade de informação produzida pode continuar crescendo, mas a quantidade de atenção humana é limitada.  Segundo ele “uma riqueza de informação cria uma pobreza de atenção e a necessidade de alocar a atenção eficientemente entre uma superabundância de fontes de informação que pode consumi-la. ”

Apesar de apontar essa problemática logo no começo da década de 70, Herbert Simon não poderia prever as mudanças no ambiente midiático que viriam nas próximas décadas. Em um levantamento do instituto de pesquisa IPSOS MediaCT, apresentado no evento da Associação Global de Profissionais de Pesquisa de Mercado e Opinião (ESOMAR) realizado em São Paulo em Abril de 2015, constatou-se que o telefone fixo levou um período de 75 anos para atingir a marca de 50 milhões de usuários globalmente. O rádio, por sua vez, atingiu o mesmo alcance em 38 anos. A televisão ocupou a mesma posição em 15 anos. O computador pessoal levou apenas 4 anos para atingir o mesmo número de usuários. E a tecnologia de comunicação de larga escala mais recente, o telefone celular, atingiu 50 milhões de usuários em apenas 1 ano de existência.

No cenário de aceleração da proliferação das tecnologias de informação e comunicação nas últimas décadas, em especial as digitais, o professor e pesquisador da Universidade de Copenhague Stig Hjarvard aponta para mudanças não só no âmbito quantitativo, mas também qualitativo nas relações entre sociedade, cultura e mídia. Ao referir-se à mídia transnacional – o desenvolvimento de tecnologias que suplantam a delimitação geográfica antes imposta pela cultura impressa dos jornais, em especial a internet, o telefone móvel, a televisão via satélite, etc – o pesquisador afirma que

O ambiente da mídia contemporânea [...] reflete uma mudança quantitativa e qualitativa profunda nas relações entre mídia, cultura e sociedade. Hoje, experimentamos uma midiatização intensificada da cultura e da sociedade que não está limitada ao domínio da formação da opinião pública, mas que atravessa quase toda instituição social e cultural, como a família, o trabalho, a política e a religião. As mídias são coprodutoras de nossas representações mentais, de nossas ações e relacionamentos com outras pessoas em uma variedade de contextos privados e semiprivados, e deveríamos considerar essa revolução significativa. (HJARVARD, 2014, p. 24)

É nesse ambiente de mudança e aceleração de convergência midiática que a problemática apontada por Herbert Simon se potencializa. Com a fragmentação das vias de interação proporcionada pelo acesso cada vez mais rápido às tecnologias de informação e comunicação, aumenta o volume de informação produzida o que gera escassez de atenção. Evidência dessa problemática foi o triste fechamento de 9 marcas da Editora Abril no começo de agosto desse ano, que serve para ilustrar que com a abundância de informação e canais de informação o público deve escolher onde e como vai depositar sua atenção.


A Editora Abril é apenas uma das muitas que se encontram em um cenário ambíguo de consumo midiático. Por um lado, a diversidade de veículos oferece um potencial gigantesco. Com o amplo acesso e a mobilidade de diferentes meios de comunicação, dispositivos comunicacionais e tecnológicos configuram um campo de possibilidades aparentemente sem limites para estratégias de alcance e divulgação de mensagens. Por outro lado, coloca-se um desafio pela hegemonia entre as diferentes mídias.

De acordo com a teoria Cultura da Convergência desenvolvida no livro homônimo de Henry Jenkins, o cenário atual é caracterizado pela reapropriação de conteúdos e produção midiática cooperativa, que integra agentes como: mídia corporativa, mídia alternativa, consumidor e afins. Os produtos de novas e velhas mídias se tornam híbridos, reconfigurando a relação entre as tecnologias, indústria, mercados, gêneros e públicos. Ocorre um cruzamento entre mídias alternativas e mídias de massa, que se tornam receptivas por múltiplos suportes, caracterizando a era da convergência midiática. Entrentanto, o austríaco François Jost se contrapõe ao uso do termo convergência uma vez que

O que se coloca há alguns anos sob o nome de convergência é um processo mutável, instável, proteiforme, em que vemos do dia para a noite, de uma país a outro, inverter a hierarquização das mídias. De um lado, a televisão dita sua lei à internet transmitindo programas que são replicados em sites dedicados ou fabricando séries que são consumidas na internet; de outro lado, os sites de compartilhamento ou de vídeo on demand propõem uma alternativa ao consumo das redes. [...] Já há algumas décadas o combate entre computador, televisão e telefone continua e é bem astuto aquele que puder dizer quem ganhará. (JOST, 2011, p. 95)


Sem previsão de vencedor nessa guerra intermidiática, como apontado por Jost, marcas e empresas tentam bombardear seus consumidores em todas as possibilidades de contato. Em estudo de hábitos de consumo de mídia realizado nos Estados Unidos, o instituto SJ Insights constatou que o número de horas a que um americano adulto é exposto a conteúdos mediados por dispositivos tecnológicos cresceu de 5,2 horas em 1945 para 9,8 horas por dia em 2014.

Entretanto, o que se vê não é uma maior assertividade em comunicação, mas um exagero que muitas vezes é prejudicial tanto para marcas quanto para consumidores. O SJ Insights estima que, das 5.000 mensagens publicitárias a que os cidadãos dos EUA são expostos diariamente, 153 sejam efetivamente notadas, 86 gerem algum tipo de lembrança e 12 sejam capazes de despertar alguma motivação. Mas então, como receber a atenção desse consumidor tão saturado de informação? A resposta talvez esteja em nossa evolução.

Para o Dr. John Medina, em seu livro Brain Rules (em inglês), existem três tipos de estímulos que geram atenção:

• Ameaça de morte: nossa necessidade de sobrevivência;
• Sexo: conteúdo sexual remete a nossa necessidade de reprodução para preservação da espécie;
• Emoções e necessidades: tudo aquilo que nos faz humanos.


Graças ao processo evolucionista que passamos, temos tendência a prestar atenção em informações passadas em um formato narrativo que contemple esses três estímulos. Não é a toa que comerciais e produtos de entretenimento vêm recheados desses elementos. Desde anúncios de venda de carros a séries premiadas como Game of Thrones, por exemplo, o Storytelling se faz necessário para cativar a atenção do público. Uma história bem contada uma vez pode valer mais do que 10 anúncios disparados em sequência.

Sendo assim, em uma cenário de guerra intermidiática o Storytelling pode vir como um tiro certeiro no público que se deseja atingir, ao invés de um lançamento de granada como muitos anunciantes fazem. No lugar de um “Quer pagar quanto?” a praticamente cada intervalo comercial, o anunciante que contar uma história que passe sua mensagem pode ter resultados muito mais satisfatórios e distribuir melhor seus gastos em comunicação ao mesmo tempo. Sabe aquela velha história do menos é mais? Então, ela também se aplica aqui. E o consumidor agradece.

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