Storyteller ou Dinossauro?

Storyteller ou Dinossauro?

Por Stefano Giorgi





  Todos os dias são dias comuns, até que alguma coisa de interessante acontece. E eu sempre procuro essa coisa interessante, mas, algumas vezes, é a coisa interessante que me acha. E foi isso que aconteceu em uma noite chuvosa de quinta-feira na ESPM-SP.
  Chuva já é uma coisa que me desanima. Não sei o por que, mas eu acredito que meu humor varia de acordo com o céu. Se o céu está claro e azul eu estou de bom humor, se está cinzento e chuvoso eu estou de mau humor. Cada dia que passa essa ideia deixa de ser uma superstição na minha cabeça e vira mais e mais uma verdade. E, talvez por isso, eu já estivesse desanimado naquela noite chuvosa na ESPM. Ou talvez fosse por ter assistido uma primeira aula que foi um porre. Seja qual for o motivo, o fato é que eu estava desanimado e a coisa parecia que iria piorar.
  Já estava sentado na sala da segunda aula, esperando que ela começasse logo, para que também terminasse logo. A única alegria que eu pensava que teria naquela noite seria a de chegar em casa e assistir “Gabriela” na televisão.
  Quando descobri que iria ter uma palestra na aula, quase levantei e fui embora. Não sei o que me segurou. Acho que foi a chuva ou o fato de faltar muito tempo para “Gabriela” começar. Nada contra a palestra em si, já que eu não fazia a menor ideia do que se tratava. Mas é que depois de tantas palestras inúteis que eu vi na minha vida fiquei traumatizado e agora só assisto as que penso que realmente me agregarão conhecimentos úteis.
  Os outros alunos começaram a chegar e, depois de a sala estar com um número expressivo de pessoas, a professora se levantou de sua cadeira, fechou a porta e apresentou o palestrante:
  - Pessoal – disse ela -, esse aqui é Fernando Palacios e ele veio aqui hoje para falar com vocês sobre Storytelling.
  Quando eu ouvi a palavra “storytelling” eu me arrependi profundamente de não ter ido embora quando tive a oportunidade, mas era tarde demais.
  Na minha cabeça “storytelling” era uma coisa inútil e se baseava em um vagabundo qualquer que teve uma história de vida interessante e a contava para inspirar os outros e ganhar dinheiro, coisa que eu poderia fazer melhor do que ninguém. Afinal, a minha coleção de histórias pessoais é um verdadeiro tesouro. Eu amo contar histórias, mas acredito que para poder contar boas histórias se deve viver boas histórias. Por isso já me meti em muita confusão. Teve a vez que convenci o meu melhor amigo de que ele estava com uma doença terminal. Teve a vez que eu fui caçado como um animal no Canadá, após passar a virada do ano em uma Rave em um celeiro no meio do nada. Teve também a vez que eu fui participar de uma orgia em uma pracinha e acabei me envolvendo no meio de uma briga de gangues. E tiveram muitas outras vezes que me renderam excelentes histórias e que eu sempre contei para todo mundo que estivesse interessado a custo 0. E talvez por isso eu tivesse um preconceito com essa coisa de “storytelling”. Mal sabia eu que minha mente preconceituosa me enganava. Mas isso eu só descobriria no final da palestra.
  Logo depois que a professora falou, o tal Fernando Palacios se levantou e com um controle remoto abriu a apresentação dos slides da sua palestra em um telão de frente para os alunos. O primeiro slide da apresentação continha uma imagem do filme Aladin e, após Fernando ter cumprimentado a sala, ele começou a fazer perguntas e falar sobre o filme. Fernando pegou uma lâmpada que ele disse ter comprado no Grã-Bazar de Istambul e perguntou:
  - E vocês, se estivessem no lugar dele, qual seriam seus desejos?
  Meu ânimo subitamente voltou. Existem temas que não tem fim e que levantam a moral de qualquer pessoal para abrir suas ideias. Temas como “O que você faria se ganhasse na loteria?”, “Como seria ter uma máquina no tempo?” e, em especial naquele momento, “Qual seriam seus desejos para o gênio da lâmpada?”. Então, como ia dizendo, meu ânimo voltou de súbito. A resposta para aquela pergunta eu já tinha na ponta da língua. Enquanto todo mundo pediria uma coisa chata e genérica como dinheiro, sucesso, felicidade, uma mulher gostosa e perfeita, uma Ferrari, a paz mundial e por aí vai, eu pediria uma coisa única, que sempre quis ter e que só conseguiria com o auxílio de um gênio da lâmpada:
  - Um dinossauro de estimação – eu respondi gerando surpresa e riso na sala de aula.
  - Um dinossauro de estimação? – Fernando me perguntou com um sorriso no rosto. – Essa eu nunca tinha ouvido antes. Mas quem sabe, no final dessa palestra, você não vai desejar virar um storyteller? Eu até te dou a chance de esfregar a lâmpada de Istambul para o gênio vir te atender.
  Eu dei risada e fiz um sinal de “talvez” com a cabeça. Mas dificilmente eu desistiria do meu dinossauro de estimação para virar um storyteller.
  E então Fernando continuou a palestra. Como meu ânimo havia mudado e minha atenção estava cativada, eu ouvi e me impressionei com tudo o que ele falou. E então percebi que storytelling não era o que eu imaginava. Não era uma coisa inútil que se baseava em um vagabundo qualquer que teve uma história de vida interessante e a contava para inspirar os outros e ganhar dinheiro. Na verdade era algo sério, complexo, inovador e extremamente interessante. Em um mundo onde é cada vez mais difícil capturar a atenção do consumidor, como Fernando Palacios fez com a minha, o storytelling oferece uma saída dinâmica e que é uma tendência cada vez maior para o futuro: o de ligar marcas, produtos e serviços a histórias. Histórias que não dizem “comprem”, mas entretêm consumidores e os fazem compreender os valores e ideais de marcas de um jeito totalmente diferente e não agressivo. De um jeito gostoso e simpático ligado ao emocional, que pode ser usado em diferentes plataformas de comunicação. E tudo isso não é fácil de fazer e muito menos para qualquer um.
  Quando Fernando terminou de falar eu aplaudi, e aplaudi muito. Sua palestra me animou de um jeito que nenhuma outra conseguiu me animar. E também serviu para me livrar dos meus traumas em relação a palestras e meus preconceitos errados sobre “storytelling”. Na verdade, depois que a apresentação acabou eu tive certeza de que aquilo seria uma coisa que poderia fazer pelo resto da minha vida. Eu amo escrever, amo criar, amo ter ideias, amo contar histórias e tenho o jeito para a coisa. Então, por que não virar um “storyteller”?
  Finalmente a professora fez a chamada e a classe estava dispensada. Eu estava livre para voltar para a minha casa e assistir “Gabriela”. Mas ainda havia uma coisa que eu precisava fazer: precisava esfregar a lâmpada.
  Mas agora qual era o meu desejo: virar um “storyteller” ou ter um dinossauro de estimação? A dúvida aumentava na minha cabeça conforme eu caminhava em direção à lâmpada. Storyteller ou Dinossauro? Storyteller ou Dinossauro? Storyteller ou Dinossauro? Dinossauro. É, realmente eu ainda queria mais um dinossauro de estimação.
  Foi então que eu peguei a lâmpada do Grã-Bazar de Istambul na minha mão e mentalizei o meu desejo. Mentalizei com força, como se realmente fosse possível um gênio sair de lá de dentro. Percebi então que a lâmpada brilhava e então a esfreguei. O coração batia forte. Por um instante pude ver uma fumaça sair do bico.
  E então... nada. Óbvio que nada iria acontecer, afinal eu estava em uma sala de aula na ESPM e não em um filme fantástico da Disney. Mas como o gênio não apareceu, eu não podia ter um dinossauro. Por isso, Fernando Palacios obteve sucesso e eu mudei meu desejo. Meu desejo agora é de virar um “storyteller”.

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