Creed - Vamos tentar de novo?

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Foi em um luta de boxe
entre Muhammad Ali e Chuck Wepner que a história de Rocky Balboa nasceu. Wepner
conseguiu um feito nunca antes realizado: ele nocauteou Ali, o então campeão.
E, mesmo não vencendo a luta, Chuck Wepner entrou para a história do boxe
mundial graças a esse nocaute.
Inspirado por essa
luta, um ator descrente em sua carreira em Hollywood passou os três dias
seguintes em sua quitinete 3X4m na companhia de seu cachorro escrevendo uma
história. Esse ator era Sylvester Stallone, e a sua criação foi a primeira
versão para o que iria se tornar posteriormente o roteiro final de “Rocky – Um
Lutador”.
Enquanto a história
original escrita por Stallone era um tanto quanto sombria, a versão de Rocky
que chegou às telas tinha por base o psicológico de alguns personagens que
marcaram o cinema da década de 40, intitulado como filmes "Noir".
Personagens descrentes da sociedade, ambíguos, alienados, formam a galeria
final de alguns principais e secundários da franquia, o que acaba por dar uma
caracterização muito mais realista ao filme, tirando um pouco da mágica e do
sonho que tanto envolve o cinema Hollywoodiano. Junto a estes personagens, há
uma crítica à sociedade americana do espetáculo, que se torna fantoche ou
marionete diante a uma mídia inescrupulosa e completamente voltada para o
entretenimento. Claro que o roteiro não deixa de incutir disfarçadamente o
"sonho americano" do pobre desconhecido que se torna visível da noite
para o dia, não sem batalhar pelo seu lugar ao sol, porém o que vale muito mais
no processo é a forma como se vive, como se percorre esse caminho do que o
objetivo final.
O resultado do filme
foi um só: um enorme sucesso. A produção de pouco mais de um milhão de dólares
conseguiu faturar 117 milhões de dólares, teve nove indicações ao Oscar (Melhor
Roteiro Original – Sylvester Stallone - , Melhor Ator – Sylvester Stallone -,
Melhor Atriz – Talia Shire -, Melhor Ator Coadjuvante – Burt Young e Burgess
Meredith -, Melhor Trilha Sonora, Melhor Som), faturou três delas (Melhor
Filme, Melhor Diretor e Melhor Edição) e deu o pontapé inicial para a franquia.
As três versões
seguintes de Rocky são divertidas e envolventes. Abandonam alguns dos elementos
de seriedade e sucesso do primeiro filme, porém conseguem agradar ao público.
“Rocky IV” seria o final perfeito para a série, exaltando o ego de Stallone e
passando sua mensagem. Infelizmente o bom senso nem sempre se aplica em
Hollywood, e surgiu “Rocky V”.
Não só pelo simples
fato de “Rocky V” não precisar existir que o filme é uma merda. É na verdade
por destruir todo o sucesso de seus predecessores. Enquanto nas quatro
primeiras versões da série o personagem trilha um caminho contínuo de desafios
e conquistas, nessa versão ele volta à estaca zero. É triste. Mas o pior é o
fato de que Rocky Balboa não pode mais subir nos ringues, o que é a cereja no
topo do bolo para essa grande cagada em forma de película.
Não satisfeitos em
cuspirem na cara de um dos personagens fictícios mais célebres da história do
cinema, eis que produzem “Rocky VI”. Por quê? Simplesmente porque o Stallone
estava afins. Se Rocky V já é triste, Rocky VI quase me fez chorar. O cara
perdeu tudo, a mulher morreu, o filho virou um merda... Tirando alguns minutos
de um diálogo inspirador, eu posso dizer que joguei duas horas da minha vida
fora.
Ao final de “Rocky VI”
eu estava cabisbaixo. Achei que tinham fodido uma das melhores franquias da
história do cinema. Enquanto os quatro primeiros “Rocky”s são excelentes filmes
motivacionais, que realmente inspiram, os dois últimos são depressivos e te põe
mais para baixo do que quando sua mãe e sua namorada se juntam para ter dar um esporro. Era realmente triste ver Rocky Balboa acabar
daquele jeito.
Acho que nos últimos
dois filmes Sylvester Stallone tinha brigado feio com seu amigo fictício.
Talvez até saíram na porrada e deixaram de se falar. Um relacionamento
desgastado com o tempo, cujo o resultado foi o que vimos nas telas. Mas acho
que Stallone e Balboa se encontraram após algum tempo em um bar para conversar
e tentar resolver as coisas.
Acho que um falou para
o outro e disse: “Ei, vamos tentar de novo?! Vamos fazer como nos velhos
tempos?”. E um dos dois respondeu: “Sim, vamos tentar de novo. Mas os tempos
mudaram e nós também.” E juntos os dois começaram a tomar cerveja e discutir a
relação.
Era óbvio que Rocky estava velho demais para lutar. Que a tecnologia e o gosto musical da nova geração mudaram radicalmente. Que o próprio boxe mudou como esporte e indústria. E que a motivação do “underdog” de antigamente também tinha mudado para outra coisa. E conversando sobre todas essas coisas Stallone e Balboa fizeram nascer Creed.
Creed ainda é uma
história de Rocky, mesmo que Rocky não seja o personagem principal. É a
continuação digna dos quatro primeiros filmes da franquia. Aliás, não só isso,
é a modernização da franquia em si.
A começar pela
motivação do personagem. Ele tem dinheiro, uma boa carreira e uma boa vida. Basicamente
os elementos do “american dream”. Mas não é isso com o que sonha. Exatamente
como os membros da Geração Y, Adonis Creed, o personagem principal, não se
satisfaz apenas com essas coisas. Por isso joga tudo para o alto e vai
perseguir seu sonho de se tornar lutador. E isso faz uma nova geração de fãs
criarem uma ligação emocional com o filme.
Adonis é um personagem
forte, ambíguo e realista, extremamente bem construído. Mas não é só ele que
está assim no filme. Rocky está mudado. Deixa de ser aquela figura mítica,
desce do Olimpo e se torna humano, deixando o papel de herói para trás e se
tornando mentor, apesar de ter sua própria batalha para lutar.
Com os novos
personagens, uma trilha sonora atualizada e jogos de câmera dinâmicos, “Creed –
Nascido para Lutar” é “Rocky – Um Lutador” para uma nova geração de fãs. A fórmula é igual e funciona, apenas modernizando os elementos. É como
se Sylvester Stallone e Rocky Balboa tivessem trocado uma ideia, resolvido suas
diferenças e voltado ao início da amizade onde as coisas eram muito mais
coerentes e divertidas.