A TECNOLOGIA DO STORYTELLING




Artigo escrito por Martha Terenzzo e Fernando Palacios, publicado originalmente no Portal HSM

O próximo filme do diretor Ridley Scott vai aos cinemas em junho, mas a história já começou na internet. A campanha de divulgação na web é no mínimo inusitada. Digo inusitada para não parecer que estou fazendo propaganda do filme. A verdade é que a estratégia é genial.

A indústria do cinema convive com a questão do sucesso ou fracasso imediato. Todos os anos de trabalho da concepção do roteiro à pós-produção e os milhões de dólares investidos são medidos em apenas dois dias: o fim de semana de estreia. Não é por menos que a turma dos trailers tenha se tornado quase tão importante quanto à do filme em si. Foi nessa antecipação que a equipe de Ridley Scott surpreendeu.

O trailer é um TED Talk, organização especializada em encontrar, promover e divulgar palestras curtas e inspiradoras. O TED existe no mundo real e adquiriu status de alto prestígio e reputação. Não basta ser famoso para palestrar. É preciso ter algo profundo e impactante para compartilhar. E ter dinheiro não é o suficiente para estar na plateia. A audiência é pinçada entre milhares de interessados que preenchem uma ficha contando suas histórias de vida. Muitas vezes, eles reúnem no auditório inúmeras pessoas com histórias tão boas quanto as dos palestrantes. A palestra vai para a internet e lá ganha uma audiência de milhões de pessoas em todo o mundo. Pois com o Ridley Scott as histórias de vida deram espaço à ficção.

O primeiro trailer-teaser da nova produção de Ridley Scott é justamente uma palestra TED... no ano 2023. Em três minutos, o personagem fictício Peter Weyland fala sobre nossa primeira tecnologia, que inclusive não fomos nós que inventamos. Veio dos deuses. Ou melhor, foi roubada deles por Prometheus: o fogo. Depois disso uma tecnologia levou a outra e ela está para falar que em breve irá lançar androides indistinguíveis de nós. E, com isso, viraremos os deuses.
Só que não foi o fogo em si que iniciou a revolução da humanidade, foi o controle sobre ele. Por isso a imagem da fogueira é tão poderosa. É um ícone universal que remete a conforto, calor, segurança, comida e, tudo isso junto, com boas histórias.

Algo tão ancestral não pode ser uma simples ferramenta. Storytelling vai muito além de realizar uma tarefa. É usado para liderar equipes, inspirar plateias, vender produtos, imortalizar um acontecimento e transmitir conhecimento.

Temos então uma nova questão. Como o simples ato de contar histórias pode realizar tantas coisas, inclusive fazer a mulher, o jovem e o editor mais ricos da Inglaterra? Simples? Não é tão simples assim. Ainda mais quando em vez de intuitivo, o processo tenha que ser planejado.

Storytelling tem tudo a ver com o símbolo da fogueira. O fogo é o “story”, a substância imaterial, a versão mental que temos de uma história. A madeira é o “telling”, sendo que cada graveto atua como uma narrativa. O fogo só ganha forma visível quando um autor narra sua versão daquela história. Primeiro é preciso ter algo a dizer (story), para depois encontrar a melhor forma de expressar (telling).

Finalmente entra em cena o conceito de transmídia. O raciocínio é de fragmentar partes da história por meio de múltiplos formatos. Cada graveto possui o seu formato e, à sua maneira, contribui para aumentar o fogo. É como o trailer do filme de Ridley Scott que simplesmente não vai aparecer na película. É uma extensão, um complemento, mas que vai além de uma tocha perdida, já que enriquece a experiência como um todo.

Qual é a genialidade do cineasta Ridley Scott? Ora, em vez de ficar criando dezenas tochas, ele cria fogueiras bem estruturadas. Anos depois é capaz de alimentar a fogueira com novos gravetos. Portanto, o fogo fica cada vez mais forte e acaba sendo visto por mais pessoas. Como ele chegou a esse trailer? Graças ao pensamento por trás do filme. De forma indireta, Prometheus é o antecessor de Alien. Já havia fogo. E Ridley Scott só aumentou a fogueira.

Imagine se as empresas tivessem este pensamento: criar histórias fascinantes que vão muito além de um simples herói da marca ou do consumidor-padrão e criar universos imersivos ricos e complexos. E assim como Ridley Scott transformou o que poderia ter sido um mero trailer num curta-metragem de três minutos, também as empresas muito além dos anúncios de situações de cotidiano e criar narrativas que ninguém quisesse pular depois de cinco segundos. Talvez até envolver, de tal maneira que as pessoas se dispusessem a pagar para ver sua mensagem corporativa. O processo é simples. Basta juntar gravetos e fazer fogo.


Martha Terenzzo e Fernando Palacios, ambos professores de Inovação e Storytelling da ESPM.
Para saber mais sobre o assunto, acesse o link

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